“Caravana da Justiça” passou esta sexta-feira pelo tribunal de Vale de Cambra para recolher informação que chegará à Assembleia da República
Os funcionários judiciais de Vale de Cambra juntaram-se esta sexta-feira à caravana, que tem percorrido os tribunais de todo o país, para fazer “um levantamento rigoroso das condições de trabalho” e reivindicar “justiça para quem nela trabalha”.
O Sindicato dos Funcionários da Justiça (SFJ) considera que o estatuto colocado em discussão pública pelo Governo “não respeita” os trabalhadores e avisa que, se não forem tomadas medidas, haverá outras forma de luta.
A operação “Caravana da Justiça”, como é apelidada pelo sindicato, termina a 15 de outubro com a entrega no parlamento de um relatório sobre as situações observadas e vai dar a conhecer as condições de trabalho de uma classe que garantem estar “esquecida na Justiça e na Assembleia da República”, sublinhou o dirigente sindical, José Torres, em declarações ao Voz de Cambra.
A Caravana passou pelo Tribunal de Vale de Cambra para escutar de cada trabalhador o diagnóstico da sua própria carreira, recolher informação sobre as condições de trabalho dos seus oficiais de justiça, tanto a nível de instalações, equipamentos e segurança, bem como ao nível de recursos humanos existentes e inexistentes.
“Queremos alertar, através deste estudo, que os oficiais de justiça não são meros números, são pessoas, que têm os seus problemas, que saem dos tribunais e têm as suas famílias e, por isso, merecem serem respeitados como todos os outros”, explicou.
Apesar de, em Vale de Cambra, ter encontrado uma situação favorável a nível de recursos humanos e de instalações, José Torres lembra as dificuldades de trabalho no dia-a-dia destes trabalhadores, as suas preocupações na progressão de carreira, entre outras que são transversais a todos no país e que devem ser “respeitados” pela tutela.
“Temos vindo a assistir a um desvalorizar dos recursos humanos que existem nos tribunais. Estamos com um défice de cerca 2200 funcionários. O Ministério reconhece que são precisos, mas não abrem concurso, nem estágios”, reforçou.
José Torres acrescenta ainda que esta ação pretende mostrar a importância desta profissão no panorama judicial do país.
“Queremos demonstrar e provar que somos operadores iguais a todos os outros, mas também que somos o rosto da justiça e o rosto dos tribunais, que somos nós que recebemos o povo, os advogados, que fazemos o elo de ligação entre os gabinetes dos magistrados e o resto da população e que merecemos mais respeito”, frisou.
Na passagem pelo Tribunal de Vale de Cambra foram entregues vários formulários, entre os quais um sobre o estado dos serviços, onde se descrevem os edifícios, seja ao nível do estado de conservação, acessibilidades, secretárias, gabinetes, salas, segurança, limpeza, o equipamento informático e outros. Outro formulário aborda o estado dos recursos humanos, designadamente quanto a faixa etária, habilitações, género, categorias profissionais, baixas de longa duração e défice nas colocações.
A informação recolhida nestes documentos será entregue ao presidente da Assembleia da República, em 15 de outubro, data em que se prevê que ocorra também a entrega pelo Governo da proposta de Lei do Orçamento do Estado para 2022.
“Há uns três anos ganhávamos mais do que agora”
Dulce Almeida é funcionária judicial há 34 anos e já passou por vários tribunais da região. Lembra ao Voz de Cambra que hoje está muito pior do que em anos anteriores, nomeadamente no que diz respeito à progressão de carreira.
“Em Vale de Cambra, não nos podemos queixar da falta de recursos humanos, porque temos o quadro completo, nem das instalações, que são boas, mas a questão dos nossos estatutos, é um problema transversal a todos os funcionários. Há uns três anos, ganhávamos mais do que agora. Noutros tempos, já estaria reformada, como outros colegas com a mesma idade. Temos também, por exemplo, falhas relativamente às baixas de longa duração, em que um funcionário está a acumular funções”, especifica a funcionária.
“Era importante devolver a Vale de Cambra as competências que já teve”
Em representação dos advogados de Vale de Cambra esteve Paulo Barbosa, que focou o “bom” relacionamento que existe entre os advogados e os funcionários judiciais e magistrados e que, por isso, estão solidários com esta reivindicação.
Em declarações ao Voz de Cambra, o advogado lembrou também algumas lacunas que existem em Vale de Cambra, nomeadamente, no que diz respeito às competências que este Tribunal perdeu, aquando da reestruturação do mapa judiciário.
“Nós temos instalações em excesso, porque temos um palácio da justiça que podia albergar outras competências e valências, o que não é o caso”, referiu.
Paulo Barbosa especificou as “excelentes condições” do Tribunal de Vale de Cambra que, atualmente, tem apenas um juízo de competência genérica.
“Já há uns anos que andamos a fazer reclamações, exposições, mas ainda não conseguimos devolver a Vale de Cambra as competências que já teve”, disse.
Para o advogado, esta é uma questão política, para a qual apela ao primeiro-ministro, António Costa – que inaugurou estas instalações, então ministro da Justiça – para que devolva as valências perdidas para outros concelhos vizinhos.
“Sabemos que esta é uma decisão política e que vem no seguimento do mapa judiciário, mas nós lamentamos muito porque, para além de ser um encargo acrescido para os advogados, é, sobretudo, um encargo acrescido para as pessoas, que têm de se deslocar para outras instâncias, nomeadamente para Oliveira de Azemeis e Santa Maria da feira”, sublinhou.